A definição da Guarda Unilateral é um dos temas mais importantes e, muitas vezes, mal compreendidos do Direito de Família. A palavra-chave para entendê-la não é apenas a moradia, mas o Poder Decisório.
A seguir, o artigo irá esclarecer com linguagem clara e acessível as diferenças principais entre guarda unilateral e compartilhada, de forma que suas dúvidas principais sobre o assunto serão esclarecidas a contento.
1. Guarda Unilateral: O Que Significa em essência?
Significa que a responsabilidade exclusiva de tomar as decisões cruciais sobre a vida do filho é atribuída a apenas um dos genitores (o Genitor Guardião). O outro genitor mantém o Poder Familiar e o inalienável dever de fiscalizar e conviver com o menor.
Em outras palavras, “na guarda unilateral, o genitor que não possui a guarda pode solicitar informações e/ou prestação de contas com relação ao genitor que a detenha, de modo que aquele possa supervisionar os interesses dos filhos” (PEREIRA, 2017, p. 341)
Atualmente, a Guarda Unilateral é tratada pela lei brasileira (Código Civil, Art. 1.583, § 1º) como a EXCEÇÃO à regra, sendo a Guarda Compartilhada a prioridade.
2. O Conceito e a Concentração do Poder Decisório
A definição legal de Guarda Unilateral é aquela atribuída “a um só dos genitores ou a alguém que o substitua”.
2.1. Poderes Exclusivos do Genitor Guardião
O genitor que detém a guarda unilateral passa a ser o principal responsável por decidir sobre o cotidiano da criança. No entanto, é preciso cautela em certas decisões:
- Residência Principal: A criança tem um lar fixo e determinado, que é o lar do guardião.
- Educação: O guardião escolhe a escola, autoriza matrículas e define o plano pedagógico.
- Saúde: O guardião decide sobre tratamentos médicos e terapias. Nota Importante: Em casos de cirurgias eletivas de alto risco ou procedimentos não emergenciais, recomenda-se a busca pelo consenso. Decisões unilaterais que coloquem a criança em risco desnecessário podem ser questionadas judicialmente.
- Mudança de Residência (Ponto de Atenção): Embora a criança resida com o guardião, a mudança de domicílio para outra cidade ou estado exige extrema cautela. Como o genitor não guardião mantém o direito de convivência, mudanças que inviabilizem as visitas dependem de consenso ou, na falta deste, de autorização judicial (Suprimento de Outorga). Mudar-se sem justificativa para local distante, visando dificultar o contato, pode configurar Alienação Parental (Lei 12.318/2010).
2.2. Direitos e Deveres do Genitor Não Guardião
É crucial entender que a perda da guarda decisória não implica a perda do Poder Familiar. O genitor não guardião mantém:
- Direito de Convivência (Visitas): É o direito do filho de manter o vínculo afetivo. O regime (finais de semana, férias, feriados) é definido judicialmente.
- Dever de Fiscalização (Supervisão): Conforme o Art. 1.583, § 3º, o não guardião tem o dever legal de supervisionar os interesses dos filhos. Isso lhe confere acesso irrestrito a informações escolares e prontuários médicos.
- Dever de Sustento (Pensão Alimentícia): A obrigação alimentar é inerente ao Poder Familiar e não se altera com o tipo de guarda.
3. A Diferença Crucial: Unilateral vs. Compartilhada
A principal confusão é a crença de que a Guarda Compartilhada significa dividir o tempo de convivência exatamente pela metade (o que seria guarda alternada). A diferença real está na gestão da vida do filho.
| Aspecto | Guarda Unilateral (A Exceção) | Guarda Compartilhada (A Regra) |
|---|---|---|
| Poder de Decisão | Exclusivo do genitor guardião. | Conjunto (Corresponsabilidade), os pais decidem juntos. |
| Residência do Filho | Uma residência fixa na casa do guardião. | Uma residência base, mas o tempo de convivência busca ser equilibrado. |
| Poder Familiar | Mantido por ambos, mas exercício prático concentrado em um. | Exercido conjuntamente em sua plenitude. |
| Filosofia Legal | Proteção contra instabilidade ou inaptidão de um dos pais. | Preservação do vínculo e participação igualitária. |
Nota: A Guarda Alternada (onde a “casa” e as decisões mudam ciclicamente) não é uma modalidade prevista legalmente no Brasil, embora possa ser acordada em regimes de convivência específicos.
4. Quando a Guarda Unilateral é Aplicada? (As Exceções)
Para que o juiz opte pela Guarda Unilateral, a situação deve se enquadrar em hipóteses que indiquem a inviabilidade da gestão compartilhada, sempre focando no Melhor Interesse da Criança, afinal a guarda compartilhada é a regra legal e somente pode ser afastada diante de prova concreta de incapacidade de um dos genitores ou de risco de exposição da criança a situação de violência doméstica ou familiar.
O juiz pode decretar a guarda unilateral nas seguintes situações (Art. 1.584, CC):
- Declaração de Desinteresse ou Abandono: Se um dos pais expressamente declara ao juiz que não deseja exercer a guarda.
- Inaptidão Comprovada ou Risco: Se um dos genitores for considerado inapto (negligência, maus-tratos, dependência química, violência doméstica ou falta de condições de segurança).
- Conflito Intenso (Alta Beligerância): A jurisprudência entende que o mero desentendimento não afasta a guarda compartilhada. Porém, se a hostilidade for tão extrema que torne a tomada de decisões conjunta impossível, prejudicando o desenvolvimento do filho, o juiz imporá a unilateral.
- Alienação Parental Grave: Pode gerar a inversão da guarda para o genitor alienado ou a fixação da unilateral como medida protetiva.
5. Um genitor que reside em outra cidade pode ter a guarda compartilhada?
Sim. o fato de um dos genitores residir em local distante, não impede que ele tenha o direito à guarda compartilhada conforme entendimento jurisprudencial a seguir:
A distância geográfica não constitui impedimento para a guarda compartilhada, podendo a convivência ser adaptada por meios virtuais e presencialmente conforme disponibilidade, conforme jurisprudência consolidada do STJ (REsp 1.251.000/MG). (TJMG – Apelação Cível 1.0000.24.310670-5/002, Relator(a): Des.(a) Paulo Rogério de Souza Abrantes (JD Convocado) , Núcleo de Justiça 4.0 – Cível , julgamento em 28/11/2025, publicação da súmula em 03/12/2025)
6. Revisão da Guarda e Intervenção Judicial
Nenhuma modalidade de guarda é definitiva (coisa julgada material). A decisão pode ser revista a qualquer tempo se houver mudança na situação fática.
1. O Processo Decisório
A decisão é subsidiada por:
- Oitiva da Criança: Se houver idade e discernimento.
- Estudo Psicossocial: Avaliação técnica de equipe interdisciplinar (psicólogos/assistentes sociais), cujo laudo frequentemente fundamenta a sentença.
2. Alteração da Guarda
O genitor não guardião pode pedir a revisão da guarda se provar:
- Redução do conflito e possibilidade de diálogo.
- Descumprimento de deveres pelo guardião (ex: obstrução de visitas).
- Benefícios comprovados ao desenvolvimento do filho com a mudança de regime.
7. Crítica Doutrinária: A Irrenunciabilidade do Dever Parental
Juristas como Maria Berenice Dias criticam a possibilidade de um pai ou mãe simplesmente “abrir mão” da guarda. O argumento é que o Poder Familiar é um dever irrenunciável (Art. 229, CF). A abdicação imotivada do convívio pode ser interpretada como Abandono Afetivo, passível de indenização civil.
A seguir as palavras da doutrinadora: “Ora, se a lei atribui a ambos os pais a responsabilização conjunta e o exercício dos direitos concernentes ao poder familiar dos filhos comuns, não há como admitir que um deles, por vontade própria e imotivadamente, abra mão de tais responsabilidades.”(Maria Berenice Dias: Guarda unilateral e o melhor interesse)
8. Considerações finais
A Guarda Unilateral é um mecanismo de proteção para evitar que a criança se torne refém de conflitos ou negligência, mas jamais isenta o outro genitor de seus deveres morais, afetivos e financeiros.
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Referências
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil – Vol. V. Atual. Tânia da Silva Pereira. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
DIAS, Maria Berenice. Guarda unilateral e o princípio do melhor interesse. CONJUR. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-18/maria-berenice-dias-guarda-unilateral-melhor-interesse. Acesso em: 06 dez. 2025.
