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Golpe do Pix e Falsa Central: Como os Tribunais Tratam o Assunto?

Sumário


Meta Description: Foi vítima do Golpe do Pix? Entenda como a “Quebra de Perfil” e as decisões de 2025 obrigam bancos a devolver o dinheiro, mesmo se você usou a senha.


1. Introdução: O impacto devastador do Golpe do Pix

Você atende o telefone e a pessoa do outro lado da linha sabe seu nome, seus dados e fala com a autoridade de um gerente. O alerta é assustador: “Sua conta está sendo invadida”. No calor do momento, o medo assume o controle. Minutos depois, seguindo orientações que pareciam ser de segurança, você percebe que caiu no Golpe do Pix.

O sentimento de violação é imediato. Porém, ao buscar socorro na agência bancária, a resposta padrão costuma ser fria e culpabilizadora: “O senhor(a) realizou a transferência usando sua senha pessoal e biometria. O banco não tem culpa de você ter caído no Golpe do Pix e não podemos fazer nada.”

Durante anos, essa narrativa prevaleceu, deixando milhares de brasileiros com prejuízos incalculáveis. No entanto, o judiciário tem se posicionado de modo a defender aqueles que por alguma razão, foram prejudicados por falhas bancárias.

Tribunais de todo o país, com destaque para decisões de novembro e dezembro de 2025 do TJMG (Minas Gerais) e TJSP (São Paulo), consolidaram um novo entendimento: o banco é o guardião final da segurança tecnológica. Se o sistema falhou em barrar uma transação atípica, a instituição financeira deve assumir o prejuízo do Golpe do Pix, independentemente da engenharia social aplicada contra a vítima.

2. Novas regras que facilitam a devolução de Pix feitos indevidamente

 Já está em operação a atualização do Mecanismo Especial de Devolução (MED), projetada para fechar o cerco contra fraudadores. A grande novidade é o rastreamento estendido: agora, os bancos podem perseguir o dinheiro mesmo que ele tenha sido transferido sucessivamente para outras contas (“contas laranjas”) para ocultar o golpe. Antes, a recuperação falhava se a conta original fosse esvaziada; com a nova regra (que se tornará obrigatória para todas as instituições em fevereiro de 2026), é possível bloquear e recuperar os valores em até 11 dias após a contestação, desde que comprovada a fraude ou falha bancária. (BRUM, 2025).


3. Responsabilidade Bancária no Golpe do Pix: O “Fortuito Interno”

Para compreender por que o banco deve pagar os prejuízos decorrentes de um Golpe do Pix, precisamos mergulhar em um conceito jurídico fundamental chamado Fortuito Interno.

De forma simplificada, o Código de Defesa do Consumidor e o Superior Tribunal de Justiça (Súmula 479) entendem que as fraudes fazem parte do risco inerente à atividade bancária. As instituições financeiras lucram bilhões anualmente com a digitalização, a redução de agências físicas e a facilidade do sistema Pix. Logo, elas devem arcar com os ônus dessa tecnologia, o que inclui a vulnerabilidade de seus sistemas de segurança.

Pense na seguinte analogia: se um shopping center cobra pelo estacionamento, ele é responsável se o seu carro for roubado lá dentro, mesmo que o ladrão tenha entrado se passando por um cliente. Com o banco é similar.

Recentemente, a 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais foi clara ao decidir que a responsabilidade do banco em casos de Golpe do Pix é objetiva. Isso significa que a vítima não precisa provar que o gerente teve “má intenção”. Basta provar que houve uma falha na segurança que permitiu a fraude.

Veja o que diz a decisão proferida em 25 de novembro de 2025:

“A responsabilidade da instituição financeira por fraude decorrente de golpe da falsa central é objetiva e não se afasta pela atuação de terceiros, por se tratar de fortuito interno.”

(TJMG – Apelação Cível 1.0000.25.411759-1/001, Julgado em 25/11/2025)

Na prática: O banco não pode simplesmente “lavar as mãos” dizendo que foi um terceiro que roubou. Se o crime ocorreu dentro do aplicativo bancário, a falha é do sistema que permitiu a operação do Golpe do Pix.


4. A prova principal no Golpe do Pix: A “Quebra de Perfil”

Esse é um ponto onde a maioria dos bancos falha.

As instituições financeiras utilizam algoritmos de Inteligência Artificial sofisticados para monitorar seus hábitos de consumo. O banco sabe o que é normal para você. Ele sabe onde você gasta, a que horas e quais valores costuma transferir.

Imagine o cenário de um aposentado que gasta, em média, R$ 2.000,00 por mês no cartão de débito e nunca faz transferências acima de R$ 1500,00. De repente, em uma única tarde de terça-feira, são feitos dois empréstimos pré-aprovados e três transferências de R$ 8.000,00 cada, via Pix, para contas desconhecidas em outro estado.

O que o sistema de segurança deveria fazer?

Deveria disparar um “alerta vermelho”, bloquear a conta preventivamente e ligar para o cliente para confirmar a autencidade.

O que configura a falha?

Quando o banco autoriza essa operação atípica em segundos, sem qualquer bloqueio. Isso facilita a concretização do Golpe do Pix.

Em um julgamento brilhante de 19 de novembro de 2025, o Desembargador Alexandre Victor de Carvalho reforçou que essa omissão caracteriza Falha na Prestação do Serviço:

“A realização de múltiplas transferências instantâneas via PIX em valores incompatíveis com o perfil de consumo da correntista aposentada, sem qualquer contenção automática, caracteriza falha na prestação do serviço.”

(TJMG –  Apelação Cível  1.0000.25.393722-1/001, Relator(a): Des.(a) Alexandre Victor de Carvalho , 21ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/11/2025, publicação da súmula em 25/11/2025)

Se o banco permitiu uma movimentação monstruosa sem te ligar para confirmar, ele assumiu o risco do Golpe do Pix.


5. Entreguei a senha no Golpe do Pix: O banco ainda é responsável?

Essa é a dúvida mais comum e a principal defesa dos bancos. Eles alegam que, como a vítima digitou a senha, o token ou fez o reconhecimento facial (selfie), a transação é legítima e irrevogável. Chamamos isso de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.

Porém, a Justiça moderna entende que a sua senha é apenas uma chave, e não um cheque em branco. O banco continua sendo o “porteiro”.

Vamos voltar à analogia: imagine que você mora em um condomínio de alta segurança com porteiro 24h. Se um bandido te engana, consegue sua chave e tenta entrar no prédio levando um caminhão de mudança para esvaziar seu apartamento, o porteiro tem o dever de pará-lo e perguntar: “Ei, o morador autorizou essa mudança repentina?”. Se o porteiro abre o portão sorrindo, sem adotar medidas de seguranças usuais e recomendadas o condomínio responde.

O mesmo vale para o Golpe do Pix. O TJMG decidiu recentemente que o uso de credenciais (senha/biometria) não isenta o banco de monitorar se a transação é fraudulenta:

“O uso de autenticação por senha ou biometria não afasta a responsabilidade do banco se, para além de não comprovada a fragilização das credenciais, as transações destoam do perfil do consumidor e não são acompanhadas de medidas preventivas adequadas.”

(TJMG – Apelação Cível 1.0000.25.381169-9/001, Relator(a): Des.(a) Jaqueline Calábria Albuquerque , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/11/2025, publicação da súmula em 17/11/2025)

Ou seja: a vulnerabilidade do consumidor (especialmente idosos vítimas de engenharia social) não anula o dever de vigilância do banco contra o Golpe do Pix.


6. O que vítimas do Golpe do Pix podem recuperar na Justiça?

Ao entrar com uma ação judicial especializada em fraudes bancárias, não buscamos apenas o valor perdido. Existem outros direitos envolvidos que as decisões do final de 2025 garantiram.

Veja o que é possível pleitear em casos de Golpe do Pix:

A. Danos Materiais (Devolução Integral)

É o básico: a devolução de cada centavo que foi transferido para a conta dos golpistas.

B. Restituição em Dobro (Empréstimos Fraudulentos)

Esta é uma questão importantíssima. Muitas vezes, o Golpe do Pix é feito com dinheiro de empréstimos que os bandidos contratam na hora, no app da vítima.

Se o banco já descontou parcelas desse empréstimo fraudulento da sua conta ou benefício do INSS, é possível pedir a devolução em dobro do valor descontado (Art. 42 do CDC). O Tribunal de Justiça de São Paulo aplicou esse entendimento em dezembro de 2025:

“Devolução em dobro – Valores indevidamente descontados – Dobra que independe de má-fé – Tese definida pelo STJ – Restituição dobrada devida.”

(TJSP;  Apelação Cível 1001199-40.2025.8.26.0624; Relator (a): Carlos Abrão; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro de Tatuí – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 01/12/2025; Data de Registro: 01/12/2025)

C. Lucros Cessantes

Se você teve, por exemplo, que resgatar investimentos com deságio ou pagar juros de cheque especial para cobrir o rombo deixado pelo Golpe do Pix, o banco deve ressarcir esses prejuízos colaterais.

A respeito dos lucros cessantes, veja a seguinte jurisprudência:

O ressarcimento do valor subtraído via PIX […] é devido, assim como a compensação pelos lucros cessantes resultantes do resgate forçado de aplicações financeiras.

(TJMG –  Apelação Cível  1.0000.25.411759-1/001, Relator(a): Des.(a) Sérgio André da Fonseca Xavier, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/11/2025, publicação da súmula em 25/11/2025)

D. Danos Morais pelo Golpe do Pix

O sofrimento, a vergonha perante a família e o risco à sua subsistência geram dever de indenizar. Não se trata de “mero aborrecimento”.

“O dano moral é evidente diante do abalo e da aflição sofridos pela vítima do golpe, ultrapassando o mero dissabor cotidiano.”

 (TJMG –  Apelação Cível  1.0000.25.360998-6/001, Relator(a): Des.(a) Maria Luiza Santana Assunção , 13ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/11/2025, publicação da súmula em 17/11/2025)


7. Alerta: Nem todo caso de Golpe do Pix é ganho

Precisamos ser honestos e transparentes: a justiça tem seus desafios e cada caso tem suas particularidades. Especialmente nos casos onde a transação foi realizada por você, dentro dos seus padrões habituais, a justiça pode entender que não houve falha do banco.

Por exemplo, se você costuma fazer Pix de valores altos diariamente para diversos fornecedores, pode ser difícil provar a “Quebra de Perfil”.

Recentemente, houve um caso julgado improcedente (a vítima perdeu) pois ficou provado que a própria vítima fez o Pix e a operação não era tão diferente do que ela costumava fazer:

“A realização de transação bancária via Pix pelo próprio consumidor, sem comprovação de falha sistêmica ou de segurança por parte da instituição financeira, afasta a responsabilidade objetiva do banco.”

(TJMG – Apelação Cível 1.0000.25.309035-1/001, Julgado em 25/11/2025)

Por isso, a análise técnica da sua situação é imprescindível antes de entrar com o processo e é crucial para evitar aventuras jurídicas.


8. Passo a Passo: O que fazer ao cair no Golpe do Pix (Via Administrativa e Judicial)

O tempo é seu inimigo. Se você acabou de sofrer um Golpe do Pix, siga este roteiro imediatamente, combinando as diretrizes do Banco Central com a estratégia jurídica.

Passo 1: Acione o MED (Mecanismo Especial de Devolução)

  • Ação: Entre em contato com seu banco (via chat ou SAC) imediatamente. Não vá à agência física se isso for demorar.
  • O que dizer: “Sofri um Golpe do Pix, quero registrar a contestação e acionar o MED agora.”
  • O que acontece: Seu banco avisa o banco do golpista. Eles bloqueiam o valor (se ainda houver) e têm 7 dias para analisar. Se confirmada a fraude, devolvem em até 96 horas.

Passo 2: Boletim de Ocorrência (B.O.)

  • Ação: Registre o B.O. na Polícia (pode ser pela Delegacia Virtual).
  • Detalhes: Cite valores, horários e demais detalhes da situação, e, se possível, os dados da conta de destino (“laranja”).

Passo 3: A Realidade (Quando o MED falha)

Infelizmente, na maioria dos casos de Golpe do Pix, os criminosos sacam o dinheiro em minutos ou transferem para outras contas (“contas de passagem”). O banco então responde: “Não há saldo para devolver” ou “Não houve falha de segurança”.

É aqui que a via administrativa morre e nasce o seu direito judicial.

Passo 4: Reúna as Provas para a Ação Judicial

Para processar o banco por falha na segurança contra o Golpe do Pix, você precisará de:

  1. Seus documentos (RG ou CNH, Comprovante de residência)
  2. Comprovantes de pagamentos;
  3. Se houver, (não é obrigatório): protocolos de atendimento do SAC (prova que tentou resolver);
  4. Se houver, (não é obrigatório): Cópia do Boletim de Ocorrência;
  5. E também é de bom alvitre, mas também não são absolutamente obrigatórios, os extratos bancários (do mês do golpe e dos 3 meses anteriores), isso é vital para provar a “Quebra de Perfil”.

Atenção ao “Golpe do Pix Errado”:

Golpistas estão enviando Pix para vítimas e pedindo a devolução para outra conta. Se você fizer isso, eles acionam o MED contra você e você perde o dinheiro duas vezes. Se receber um Pix errado, use apenas a função “Devolver Pix” do aplicativo bancário.


9. FAQ: Perguntas Frequentes sobre o Golpe do Pix

Para finalizar este guia, respondemos às dúvidas mais comuns que chegam ao nosso escritório sobre o tema.

1. Quanto tempo demora um processo de Golpe do Pix?

Embora não exista prazo fixo, ações envolvendo direito do consumidor e Golpe do Pix costumam tramitar entre 12 a 24 meses em primeira instância. Contudo, em casos urgentes (como risco ao sustento alimentar), é possível pedir uma “liminar” para suspender cobranças de empréstimos fraudulentos logo no início.

2. O banco devolve dinheiro de Golpe do Pix feito à noite?

As regras do Banco Central limitam transações noturnas (geralmente R$ 1.000,00 entre 20h e 06h). Se o banco permitiu um Golpe do Pix de valor alto nesse horário, a falha de segurança é gravíssima e a chance de indenização aumenta consideravelmente.

3. Preciso de advogado para recuperar valor do Golpe do Pix?

Para valores até 20 ou 40 salários mínimos, é possível usar o Juizado Especial Cível. No entanto, devido à complexidade técnica de provar a “Quebra de Perfil” e debater a Súmula 479 do STJ, a assistência de um advogado é altamente recomendada para não perder o processo por falta de argumentos e provas técnicas.


10. Conclusão: Não aceite o prejuízo do Golpe do Pix calado

O sistema bancário investe pesado em tecnologia para facilitar transações, mas muitas vezes falha em proteger o usuário na mesma proporção. Se essa tecnologia falhou em detectar uma movimentação que claramente não era sua, a responsabilidade é da instituição financeira.

As decisões de recentes dos tribunais demonstram que o judiciário está atento e protegendo o consumidor hipossuficiente contra os danos do Golpe do Pix.

Você foi vítima?

Não deixe o tempo passar. Reúna seus extratos e o Boletim de Ocorrência. A partir disso, é possível traçar uma estratégia jurídica sólida baseada na falha de segurança e na quebra de perfil de consumo.


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Este artigo possui caráter informativo e não substitui a consulta jurídica. A jurisprudência citada refere-se a decisões específicas e cada caso deve ser analisado individualmente.

Referências

BRUM, Gabriel. Veja como vai funcionar devolução do Pix em caso de golpe. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2025-11/veja-como-vai-funcionar-devolucao-do-pix-em-caso-de-golpe. Acesso em 03/12/2025.

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Diego Ribeiro de Souza. OAB MG 211.02

Advogado atuante nas áreas cíveis e trabalhistas, escritor, pesquisador.

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